Da minha educação fez parte a aceitação de diferentes pontos de vista. Desde pequenina, em casa, na escola, até à formação superior e pós superior. Sempre aprendi que a compreensão do outro e do que nos rodeia faz com que sejamos mais tolerantes e profícuos relativamente ao nosso ser e estar biopsicossocial. Fizeram-me mesmo crer que esta forma de pensar me traria paz interior e uma boa vida.
Não desfazendo todos os meus mentores, começo a ficar um pouco céptica. .
Excepto quando estou no meio da serra da arrábida, do alentejo, ou em qualquer um desses refúgios que ainda existem neste rectângulo na ponta da europa, tudo o resto tresanda. Tresanda a incompreensão – no sentido lato e no sentido restrito – , tresanda a preguiça, a burrice, a injustiça.
Como diria a Lianne, uma boa rapariga holandesa apaixonada por Portugal, no seu português cabal: ‘sim linda, mas se vocês funcionassem bem, deixavam de ser mágicos’.
Acho lindíssimas estas palavras e, de certa forma, algo verdadeiras, ditas por alguém que vem de um país rígido e frio, para o qual tudo tem horários, marcações, não há atrasos nem desleixos. Fazer as coisas minuciosamente bem feitas no Norte da Europa não é uma opção, é um dever inolvidável. Daí eles darem tiros nos miolos. [uma nota: amesterdão NÃO é uma amostra da holanda, amesterdão é amesterdão, ponto final. Experimentem passar uma semana com uma família holandesa e perceberão o que digo].
Mas, foda.se. Portugal não é o único país quente e paradisíaco da Europa. Não nos desculpemos com as praias, com o campo, com o bacalhau e com os caracóis no final de tarde de sábado, porque a mim não me convencem. Há demasiada contradição estúpida aqui.
A começar por cima, temos um primeiro ministro que acabou um curso superior numa universidade privada (ou não) através do suborno - quando, perto de nós, estudantes que deram o cú e três tostões para entrar numa universidade pública, não têm pasta para mandar cantar um cego e tentam adquirir uma bolsa de estudo e para isso preenchem uma infinidade de papéis. Neste processo chega-se ao ridículo de se avaliar, de acordo com os casos, os litros de leite que a vaca dos pais dá por dia. Conseguem 120 euros de bolsa por mês, nos quais já está incluída a renda da residência universitária (se assim o desejaram). Não vou comentar as residências.. Pagam menos 200 euros de propinas anuais, cerca de 800 euros. Multiplicando 120 por 12, ficamos com 1440 euros por ano. Subtraíndo 800, ficamos com 600 euros por ano. Se o Sr. José Sócrates me disser que consegue viver um ano em Portugal com 600 euros, eu dou-lhe um beijo na boca. Francês. Juro. E juro porque sei que o Sr José Sócrates gasta 600 euros num dia se for preciso, a pagar um jantar no Eleven para ele e para os amigos. A cereja no topo do bolo: se não tiverem dinheiro para pagar a propina na data X, as notas não saem na pauta e o aluno pode reprovar, depois de ser achincalhado pela senhora incompetente dos serviços de acção social “ai a sua mãe não tem dinheiro? Ela que vá lavar escadas....”
Temos um ministro da Saúde que, apesar de médico frustrado, nem se deu ao trabalho de consultar uns livrinhos de Saúde Pública antes de aceitar o cargo. Porque, senhor ministro, se V.Exa se der ao trabalho de, numa das visitas a qualquer país desenvolvido Europeu, perceber os Sistemas de Saúde, entende que não é pelo telhado que se constrói a Casa. Existe uma coisa chamada Saúde Primária (que, etimologicamente, significa que vem antes da Secundária e da Terciária), que serve para resolver os copos de água antes de eles se transformarem em tempestades. Um dia hei-de almoçar consigo e, depois de uns copos de vinho tinto, convencê-lo-ei de que é mais barato pagar bem a profissionais de saúde para estarem 24/7 nos Centros de Saúde por esse país fora a ajudar a prevenir Problemas de saúde pública do que resolvê-los em hospitais a 70 km das localidades. Sim, as SAPs são importantes after all. Porque, contrariamente ao seu caso, a maior parte das pessoas não tem médico nem enfermeiro particular, e paga impostos para ter Saúde de Qualidade. E certamente não quer morrer a meio caminho do hospital de enfarte do miocárdio. A saúde é a minha área, portanto, até lhe fazia um relatório completo do novo Plano Nacional de Saúde, mas por essa altura você ressonaria, desinteressado, efeito do vinho e da conversa, porque acha solenemente que a Saúde tem de dar lucro. Engana-se. A Saúde e a Educação, segundo os desígnios dos países desenvolvidos são as únicas fontes de despesa válidas.
Temos um sistema de justiça que não funciona, não porque não tenhamos bons profissionais a exercê-la, – na área da argumentação o português é exímio, se tiver uma superbock em frente ao queixo a coisa melhora – mas porque são POUCOS e não são organizados. Por outro lado, e talvez por preguiça, o nosso Código Penal, Código Civil, Código da Estrada, enfim, legislação em geral, é muito incompleta e incoerente na maior parte dos casos. Sabemos que se cometem crimes, sabemos que há coisas que funcionam mal, e comentamos com os amigos à sexta à noite, muito indignados. Mas não fazemos nada. Porquê? Porque sabemos que se tentarmos vamos perder tempo e dinheiro, vamos dar a um beco sem saída onde no final está um funcionário público a dizer que já são 16 e que agora só em setembro, porque em agosto o sôtor está de férias.
Posso continuar, e quem me conhece sabe que sou capaz de estar uma noite inteira a dissertar sobre os problemas desta república que amo de perdição, que tento compreender, mas que me desilude de dia para dia.
A incredulidade aos 24 anos é triste e, por sabê-lo, em vez de comprar casa, comprar carro, casar e ter filhos, vou ver se aprendo mais qualquer coisa aí num sítio qualquer, para ver se volto a acreditar que no fim do arco-íris existe um pote com ovos de ouro que pague a mudança disto tudo.
Parece megalómano, mas foi assim que me ensinaram. .
e.
Não desfazendo todos os meus mentores, começo a ficar um pouco céptica. .
Excepto quando estou no meio da serra da arrábida, do alentejo, ou em qualquer um desses refúgios que ainda existem neste rectângulo na ponta da europa, tudo o resto tresanda. Tresanda a incompreensão – no sentido lato e no sentido restrito – , tresanda a preguiça, a burrice, a injustiça.
Como diria a Lianne, uma boa rapariga holandesa apaixonada por Portugal, no seu português cabal: ‘sim linda, mas se vocês funcionassem bem, deixavam de ser mágicos’.
Acho lindíssimas estas palavras e, de certa forma, algo verdadeiras, ditas por alguém que vem de um país rígido e frio, para o qual tudo tem horários, marcações, não há atrasos nem desleixos. Fazer as coisas minuciosamente bem feitas no Norte da Europa não é uma opção, é um dever inolvidável. Daí eles darem tiros nos miolos. [uma nota: amesterdão NÃO é uma amostra da holanda, amesterdão é amesterdão, ponto final. Experimentem passar uma semana com uma família holandesa e perceberão o que digo].
Mas, foda.se. Portugal não é o único país quente e paradisíaco da Europa. Não nos desculpemos com as praias, com o campo, com o bacalhau e com os caracóis no final de tarde de sábado, porque a mim não me convencem. Há demasiada contradição estúpida aqui.
A começar por cima, temos um primeiro ministro que acabou um curso superior numa universidade privada (ou não) através do suborno - quando, perto de nós, estudantes que deram o cú e três tostões para entrar numa universidade pública, não têm pasta para mandar cantar um cego e tentam adquirir uma bolsa de estudo e para isso preenchem uma infinidade de papéis. Neste processo chega-se ao ridículo de se avaliar, de acordo com os casos, os litros de leite que a vaca dos pais dá por dia. Conseguem 120 euros de bolsa por mês, nos quais já está incluída a renda da residência universitária (se assim o desejaram). Não vou comentar as residências.. Pagam menos 200 euros de propinas anuais, cerca de 800 euros. Multiplicando 120 por 12, ficamos com 1440 euros por ano. Subtraíndo 800, ficamos com 600 euros por ano. Se o Sr. José Sócrates me disser que consegue viver um ano em Portugal com 600 euros, eu dou-lhe um beijo na boca. Francês. Juro. E juro porque sei que o Sr José Sócrates gasta 600 euros num dia se for preciso, a pagar um jantar no Eleven para ele e para os amigos. A cereja no topo do bolo: se não tiverem dinheiro para pagar a propina na data X, as notas não saem na pauta e o aluno pode reprovar, depois de ser achincalhado pela senhora incompetente dos serviços de acção social “ai a sua mãe não tem dinheiro? Ela que vá lavar escadas....”
Temos um ministro da Saúde que, apesar de médico frustrado, nem se deu ao trabalho de consultar uns livrinhos de Saúde Pública antes de aceitar o cargo. Porque, senhor ministro, se V.Exa se der ao trabalho de, numa das visitas a qualquer país desenvolvido Europeu, perceber os Sistemas de Saúde, entende que não é pelo telhado que se constrói a Casa. Existe uma coisa chamada Saúde Primária (que, etimologicamente, significa que vem antes da Secundária e da Terciária), que serve para resolver os copos de água antes de eles se transformarem em tempestades. Um dia hei-de almoçar consigo e, depois de uns copos de vinho tinto, convencê-lo-ei de que é mais barato pagar bem a profissionais de saúde para estarem 24/7 nos Centros de Saúde por esse país fora a ajudar a prevenir Problemas de saúde pública do que resolvê-los em hospitais a 70 km das localidades. Sim, as SAPs são importantes after all. Porque, contrariamente ao seu caso, a maior parte das pessoas não tem médico nem enfermeiro particular, e paga impostos para ter Saúde de Qualidade. E certamente não quer morrer a meio caminho do hospital de enfarte do miocárdio. A saúde é a minha área, portanto, até lhe fazia um relatório completo do novo Plano Nacional de Saúde, mas por essa altura você ressonaria, desinteressado, efeito do vinho e da conversa, porque acha solenemente que a Saúde tem de dar lucro. Engana-se. A Saúde e a Educação, segundo os desígnios dos países desenvolvidos são as únicas fontes de despesa válidas.
Temos um sistema de justiça que não funciona, não porque não tenhamos bons profissionais a exercê-la, – na área da argumentação o português é exímio, se tiver uma superbock em frente ao queixo a coisa melhora – mas porque são POUCOS e não são organizados. Por outro lado, e talvez por preguiça, o nosso Código Penal, Código Civil, Código da Estrada, enfim, legislação em geral, é muito incompleta e incoerente na maior parte dos casos. Sabemos que se cometem crimes, sabemos que há coisas que funcionam mal, e comentamos com os amigos à sexta à noite, muito indignados. Mas não fazemos nada. Porquê? Porque sabemos que se tentarmos vamos perder tempo e dinheiro, vamos dar a um beco sem saída onde no final está um funcionário público a dizer que já são 16 e que agora só em setembro, porque em agosto o sôtor está de férias.
Posso continuar, e quem me conhece sabe que sou capaz de estar uma noite inteira a dissertar sobre os problemas desta república que amo de perdição, que tento compreender, mas que me desilude de dia para dia.
A incredulidade aos 24 anos é triste e, por sabê-lo, em vez de comprar casa, comprar carro, casar e ter filhos, vou ver se aprendo mais qualquer coisa aí num sítio qualquer, para ver se volto a acreditar que no fim do arco-íris existe um pote com ovos de ouro que pague a mudança disto tudo.
Parece megalómano, mas foi assim que me ensinaram. .
e.
7 comments:
Ao menos tentem informarem-se primeiro. As bocas depois. Senão, ninguém os leva a sério. Como pode o ministro da saúde ser um médico frustrado se ele não é médico???
tem toda a razão, . quando disse médico frustrado, expliquei-me mal. queria dizer Frustrado de Medicina. Obrigado pela observação.
bem, eu cá também poderia dar o meu contributo em forma de protesto ao mais puro gênero rebelde sem causa, ou até em forma de longa dissertação.. Mas visto que estou no meio da serra e numa maravilha da tecnologia com um telemóvel , fico-me dizendo que não ia adiantar pois há pessoas que não se aguentam até depois da uma.:) de qualquer modo, bom desabafo.. *
Parece-te que toda a gente partir é uma boa solução para os nossos problemas.
devo salientar que este post é um desabafo pessoal escrito no comboio entre alcácer e tunes; os pensamentos são Meus e apenas os partilho... não pretendo converter ninguém. Claro que fugir não é solução para os nossos problemas. . Mas quem falou em fugir aqui ? :-)
então sendo um desabafo não tem muito mais que se lhe diga! Esses geralmente são sempre escritos ou expelidos com cabeça quente, ou será que este é um desabafo racional, ou raciocinado?
é raciocinado emocionalmente. . é o que acho que se passa de mal no meu país e uma tentativa de o expelir sob a forma de parágrafos construídos.
cá do fundo....
Post a Comment